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Crítica | O Enigma de Mu [Primeira Aparição: Professor Zapotec]

Surge o querido professor da futura saga da Máquina do Tempo.

por Luiz Santiago
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Escrita e desenhada por Massimo De Vita, O Enigma de Mu (1979) tem uma considerável importância dentro do Universo da Disney nos quadrinhos porque traz a estreia de um personagem muito interessante, o Professor Zapotec, cujo nome pode ter sido inspirado na civilização pré-colombiana dos Zapotecas, que surgiu no sul do México por volta de 700 a.C.. Com o passar das aventuras do personagem, descobriríamos que ele é um arqueólogo de grande erudição e fama (embora nessa estreia já dê para perceber isso, assim como o fato de ele ser bastante atrapalhado e sensível, desmaiando facilmente por qualquer coisa), e que assumiria o cargo de diretor do Museu de História e Arqueologia de Patópolis. A partir de 1985, na aventura O Segredo da Mona Lisa, ele passaria a fazer parte das histórias da saga Máquina do Tempo, colaborando e brigando por temáticas científicas com seu amigo, o Professor Marlin, com quem também discorda o tempo inteiro sobre temas como culinária, música, futebol, moda, e muitos outros.

Nessa primeira aparição, o personagem é retratado como aqueles velhinhos simpáticos, sábios e meio malucos que levam os mocinhos (no caso Mickey e Pateta) para aventuras arriscadas e que podem trazer algum conhecimento para o leitor — mesmo que esse conhecimento seja uma mistura de fatos históricos, espaços geográficos e personalidades reais embrulhados em um roteiro cujo foco principal é divertir. O roteirista planta uma boa semente logo nas primeiras páginas, colocando o Pateta como um viciado em resolver cruzadinhas e enigmas de jornais, algo que, na segunda parte da trama, seria utilizado de maneira prática, como chave de um enigma que nem o investigador Mickey ou o capacitado arqueólogo Zapotec conseguiram notar. É uma boa maneira de utilizar o Pateta sem fazer com que ele perca o seu comportamento bobo e inocente (falando nisso, uma cena aqui me lembrou um pouco da fofura de O Bebezão, destacando a amizade entre ele e Mickey).

O foco da história é a busca pelas terras de Mu, lendário continente que colapsou por motivos desconhecidos (assim como outros continentes lendários como a Atlântida e a Lemúria). Segundo a especulação, as únicas sobras desse continente que ainda existem são a Nova Zelândia e a Nova Caledónia. Zapotec está sendo perseguido por alguém misterioso porque tem o segredo para encontrar não apenas uma parte desse continente, mas a chamada “Árvore da Vida“, uma criação dos antigos habitantes de Mu que daria ao indivíduo a capacidade de se regenerar (me lembrou o princípio de regeneração celular visto em Perry Rhodan: O Imortal), o que, em outras palavras, garantiria vida eterna à pessoa que continuasse utilizando o fruto ou o que quer que viesse dessa tal “Árvore”. Toda a história, portanto, se desenvolve a partir de uma busca na qual Mickey e Pateta são inseridos meio desajeitadamente — eu entendo por quê o professor foi procurar o rato: ele é um detetive e poderia ajudar a investigar e barrar os perseguidores do professor… mas o roteiro não é muito sutil na forma como desenvolve isso.

A parte divertida da busca, com cenas de perseguição, náufragos, desmaios, pauladas na cabeça e um plano muito bem arquitetado pelo inimigo da vez (Doriano De Vulpis) é representada exemplarmente pela arte de De Vita, que consegue uma constância muito maior que o roteiro, em termos de qualidade. Como é comum em histórias em quadrinhas pensadas para um público infanto-juvenil (mas que pode acontecer em qualquer tipo de ficção, com o mesmo resultado negativo), o que mata muitas cenas são as coincidências ou a interrupção de um encadeamento muito bom do texto para apresentação de um caminho diferente, mais simpático e muito mais fácil quando pensamos em continuidade. Isso acontece quando De Vulpis aparece na mesmíssima ilha em que está o professor e seus companheiros, e ao longo da trama mais alguns desses eventos “impossíveis” estarão presentes. É aquela coisa: a gente espera coincidências de tramas assim, e dependendo de quais forem, elas possuem até algum charme. Não é o caso, todavia, das que estão presentes nessa história.

Quero finalizar dizendo que a citação ao bispo espanhol Diego De Landa, à destruição e à posterior reescrita dos textos maias e também à existência do Códice Troano (catalogado como Códice de Madrid, hoje exposto no Museo de América em Madrid) são reais, assim como a lenda do continente de Mu, mas é sempre bom lembrar que estamos lendo esses dados adaptados a uma linguagem cômica, brincando com a ideia desse continente e com muitas simplificações, cortes e generalizações históricas para o bem do roteiro, o que é perfeitamente compreensível. Levanto essa bola aqui porque sempre aparece alguém para reclamar que “tal fato histórico não foi bem representado” e eu, como historiador, sou o primeiro a rir desse tipo de reclamação que cobra da ficção aquilo que ela nunca se propôs ou tem obrigação de dar: veracidade histórica. O Enigma de Mu é uma introdução divertida para o Professor Zapotec, o atrapalhado, inteligente e simpático estudioso que ganharia muito destaque nas histórias do Mickey alguns anos depois.

Mickey e o Enigma de Mu (Topolino e l’enigma di Mu)  — Itália, 19 de agosto de 1979
Código da História: TL 1238-AP
Publicação original:
Topolino (libretto) nº 1238 – 1239
Editora original: Mondadori
No Brasil: Não publicado (pelo menos até março de 2022)
Roteiro: Massimo De Vita
Arte: Massimo De Vita
Capa original: ?
64 páginas

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